quinta-feira, 22 de abril de 2010

Tripalium

Mais um dia se inicia e ainda é noite... Um longa jornada tenho pela frente. Quatro horas de sono é o que separa ontem de hoje. Me banho, me visto, me mascaro. Estou pronta pra começar minha labuta, meu pau-de-arara. Caminho com muitas pessoas, durante muito tempo para chegar até a minha senzala climatizada. Bom dia ao feitor e me ponho logo em posição para os açoites. Meu primeiro carrasco chega. Vou até ele com um sorriso de plástico, me esforçando para parecer real. Ele escolhe a mercadoria, depois de meia hora escolhendo (e olhe que é apenas algo para proteger seus pés), e eu vou buscá-la no estoque. Meu dono temporário tem um cheiro horrível. Nem todos são assim, mas eu tenho que continuar mostrando satisfação. Como uma indiana que lava os pés do marido, estou eu, agachada em sua frente, e ele me olha com olhos famintos... Tenho que aguentar isso também e o pior: fingir que gosto. Depois de toda a encenação (e humilhação) ele se satisfaz, compra, me dá seu telefone (que logo após ele sair, terá o lixeiro como destino) e vai embora. Acho que sou boa atriz, pois a maioria deles ficam contentes e acabam retornando. Não demora e chega outro, e outro, e outro, e outro... E tudo se repete. Igualzinho ao anterior... Sempre a mesma coisa. Mas na hora do almoço, até escravos descansam... O que complica é essa comida cara e oleosa. Não tem nada sudável aqui. Mas fazer o quê? Deve ser o meu castigo. Depios de uma refeição rápida (tenho a liberdade de até uma hora para me alimentar e descansar, mas volto antes, senão o capitão-do-mato vem atrás!) vou ao banheiro... Queria um pouco de vida no meu rosto, mas não posso borrar minha máscara de alegria. Não posso deixar a realidade transparecer ou... É melhor nem pensar nisso. Prefiro ficar quieta e fazer o meu papel de mulher-objeto. O meu nem é tão ruim assim, só tenho que aguentar uns idiotas que aparecem e fingir que gosto! Se você pensar bem, tem coisa muito pior acontecendo por aí em relação a esse assunto. O sol se põe e eu mal o vi. As luzes artificiais é que fazem parte da minha vida. Só quando o feitor nos libera é que posso ver a luz do sol, mesmo assim ela só aparece refletida na lua. Todo o meu corpo dói e mal consigo me pôr de pé. Ainda tem todo o longo caminho de volta. Em casa, despejo água em minha cabeça para esfriar os nervos e relaxar meu corpo. Como qualquer coisa, para enganar a fome (que é um dos meus algozes durante todo o dia) e vou para o meu quarto. Deito-me como um bebê e durmo como pedra... Mas quatro horas passam mutio rápido...

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